Saudade

Saudade que como com arroz e feijão, em ato quase cotidiano, tento digeri-la, transformá-la em mais um ato comum na minha vida... Doce inocência... Ela dorme comigo, me acorda às vezes, lava meu cabelo cheiroso, acaricia meu corpo, aprecia meu cheiro, sente meus lábios molhados de desejo, goza comigo, dança comigo, canta no chuveiro... Como não sei o que fazer dela, não consigo mandá-la embora ainda, ela é tão bonita, gostaria de soltá-la como um pássaro, para que voe para longe... Já tentei algumas vezes... Ela volta, diz pra mim que sussurrou no ouvido dele o quanto tá guardadinho aqui, fazendo calor no meu coração, apesar de eu ter tentado fingir bem uma partida definitiva (o teatro e a literatura me deram dessas coisas de final poético, eu queria que na vida tb desse pra fechar o livro ou as cortinas...), mas não sei se ele ouviu, se sente, se sabe... Que diferença faria se soubesse tb?... Pra que essa saudade não volte do fundo do estômago e eu lhe vomite o que não consigo conter, desisti de comê-la... Jogo-a nas palavras ditas por aí... Nos meus cadernos que cultivo desde a adolescêcia, outrora seriam folhas a fio... Mas por vezes e vezes as palavras faltam... Nunca me senti assim... Sem conseguir explicar, sem conseguir entender... Às vezes saudade me vem como um nó na garganta e transborda, lava meu rosto, alivia um pouco... Mas não dói... Não dói... Ela nunca dói... Mas me deixa perdida se lhe dou ouvidos... Tenho que pô-la a trabalhar junto comigo para que não me paralise... Ela me faz companhia... Minha criança interna, meus eus que me preenchem riem de mim... Dessa humanidade tão tola que insiste em incompreender a simplicidade da vida... O bom delas me rirem e me abraçarem é que mantenho saudade apartada de mim, e assim sei que um dia ela vai embora, pois não preciso dela para viver... Mas não entendo os risos... Não entendo o que eu poderia fazer se não é de mim que depende a partida de saudade... Sei que ela hoje me é dia a dia e que também um dia ela há de partir...

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